domingo, 14 de junho de 2009

O último voo

Preparou tudo cuidadosamente.
Não era o plano de voo mais importante da vida
mas era o definitivo.
Era preciso checar cada detalhe.
Conferir os mapas, traçar a rota,
E o principal:
Indicar os próximos passos para quem ia ficar.
Como um comandante centralizador, fez tudo sozinho.
Poderia ter dividido.
Quem sabe com um co-piloto ?
Mas talvez, pelos descaminhos do dia a dia , pelas teimosias do coração,
tenham faltado co-pilotos ao seu lado e se acostumou a tomar decisões, só e pra si...
Talvez tenha sido assim quando voava pelo Correio Aéreo e pousava em lugares
perigosos, pistas de terra no meio da floresta, nas missões de salvamento e ajuda de que tanto se orgulhava.
Não dá pra saber agora.
O plano de voo foi feito para ser cumprido.
E ele decolou...
Com certeza, não imaginava tanta turbulência.
O velho avião, já estava marcado pelos ventos do tempo,
e ele sabia que não ia ser fácil...
Mas por que tanta nuvem, tantos raios, tanto mau tempo naquela viagem ?
Quem tem a resposta ?
Aos poucos, o radio não recebia mais mensagens
por mais que a torre tentasse falar,
tentasse orientar,
tentasse confortar...
Não havia resposta.
O silêncio das alturas começou a se estabelecer...
Mas aquele ponto de luz ainda brilhava no radar.
Todos sabiam que o motor era guerreiro,
não falhava...
Mesmo que as asas trepidassem,
mesmo que o leme não atendesse mais aos comandos...
o motor teimava em roncar.
Foi sempre um motor forte acostumado a tempestades
que soube conduzir sonhos,
rasgar caminhos,
levar a vida
e transportar vidas pelo céu azul...
Naquele momento, o plano de voo não estava saindo como o previsto.
Mas um bom comandante está sempre preparado
para as interferências do destino.
E ele seguiu...
Aos poucos,
a luz foi sumindo no radar,
na esperança dos olhos de quem estava com os pés na terra
e carregava uma história de convívio, amizade, respeito, carinho e amor no coração.
De repente, a luz se apagou...
O velho avião riscara os limites da existência...
Mas os planos do último voo ficaram
e foram seguidos,
marcados pela saudade, pelas dúvidas de decisões que não foram tomadas,
pelas últimas palavras que não foram faladas......
A história terminaria aqui mas um radio-amador,
numa ilha imaginária entre o Atlântico e o Pacífico,
captou mensagens que pareciam perdidas nas nuvens.
Uma delas falava do orgulho de um velho comandante pelas conquistas da vida...
Outra dizia a respeito a uma das ultimas visões que ele teve da pista:
o comandante não imaginava
que ela estaria tão cheia de amigos, sentimentos e carinho em volta do seu filho...
E partiu mais feliz...

E por último, o radio-amador captou diálogos vindo de algum ponto do paraíso
entre os rádios dos aviões dos coronéis Gomes, Braga e Carvalho.
Felizes, davam boas-vindas ao mais novo membro da esquadrilha do céu:
o coronel Celio Pereira.

Beijo, pai.

7 comentários:

bia disse...

Ricardo,
tenho certeza que ele está muito feliz e orgulhoso do voo mais perfeito que ele fez na vida: educar o filho maravilhoso que ele tem. Cheio de amigos, amado, respeitado, querido, com uma família linda (nora, neto, neta) e que deu a ele o maior amor do mundo.
Ele foi em paz.
Um beijo.

bia disse...

Ricardo,
tenho certeza que ele está muito feliz e orgulhoso do voo mais perfeito que ele fez na vida: educar o filho maravilhoso que ele tem. Cheio de amigos, amado, respeitado, querido, com uma família linda (nora, neto, neta) e que deu a ele o maior amor do mundo.
Ele foi em paz.
Um beijo.

carol disse...

Que lindo.

Ricardo, meu abraço forte pra ti!

Beijo da ex-aluna Carol!

Ana disse...

Querido amigo,
Lindas palavras, lindo sentimento o seu. Que felicidade a do seu pai, ter tido um filho assim, com tanto amor por ele, tão visível nesse texto!
Pode ter certeza que essas palavras chegaram até ele, ecoando forte nesse lindo céu de outono, em que ele fez o seu último voo!
Um beijo grande,
Ana

Reynaldo disse...

Meu amigo, que lindo tudo o que você escreveu. Que lindo esse amor.
Com certeza ele agora aterrizou em uma pista tranquila, sem turbulência, sem susto e sem medo.
Abração para você. Sinto não ter estado perto de você em um momento como esse.

Lady Shady disse...

Queridos Ricardo e Regina,

Essa amiga nova aqui desculpa-se por não ter estado com vcs na cerimônia de despedida de alguém que foi, sem dúvida, tão amado e que tanto lutou durante seus últimos momentos nesse mundinho bonito.
Mas sabia que estariam cercados e amparados por muitos amigos de longa data.
Seu texto, Ricardo, é lindo demais!
Uma homenagem digna mesmo do filho muito bem criado e amado que vc ainda é (sim, porque a vida continua em outro plano, e o sentimento não cessa com a partida).
Isso é aparente mesmo para alguém como eu, que o conhece há tão pouco tempo.
Sem dúvida nenhuma, tal Coronel partiu orgulhoso da vida que teve e do legado que deixou.
E apesar da dor e da saudade, deve-se agradecer a Deus por ter dado a ele vida longa, e ter tido a generosidade de permitir com que a Natureza seguisse seu rumo correto e esperado, que é acolher os pais antes dos filhos.
Muita força, paz, alegrias futuras e consolo pra vcs e toda família.

Grande abraço apertado!

Simone Franco - Garota Polishop

Anônimo disse...

Ricardão, foi um voo em paz, temos certeza. Como de costume, sábias as suas palavras. Um forte abraço meu amigo,Gaúcho.