segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Luís Felipe.

O ano era 1978. Eu tinha 20 anos. Cabelos longos, idéias abusadas e uma vontade de curtir o sol, o posto nove e a vida descompromissada...
Pois foi naquela época que eu tive a primeira sensação de ser pai... Uma bobagem mas um sentimento que foi importante pra mim.
Através de uma amiga da Faculdade, conheci uma família formada pela mãe Denise e os filhos Monica e Luís Felipe... O menino tinha 11 anos. Meio gorducho, meio vesgo... Gostava de praia, não era de estudar, adorava futebol, torcia pelo Flamengo e sentia, como todo menino daquela idade, a ausência do pai. Tinha um olhar triste, um sorriso tímido e uma vontade enorme de agradar...
O Flamengo começava a formar o maior time da sua história. Zico e companhia se preparavam para conquistar o planeta. Eu não perdia um jogo. E Luiz não tinha quem o levasse para o Maracanã... Acabou virando meu companheiro de arquibancada.
Às vezes, nossa distância de quase dez anos crescia e eu me sentia mais velho, responsável por ele, quase pai, dividindo as lições das vitórias e das derrotas... Às vezes, nossa distância se encurtava e éramos apenas irmãos...Brincando, gozando e curtindo as alegrias da juventude...
Me lembro do brilho dos olhos dele descobrindo como a emoção de torcer unia as pessoas... Negros, brancos, pobres, ricos, velhos, jovens, zona sul, zona norte...todos éramos uma só família, uma mesma paixão.
Quando o gol saía, transformávamos aquela energia em esperança, em felicidade, em amizade eterna, mesmo que por alguns segundos...
Não esqueço o primeiro título que o garoto viu na arquibancada. Um gol aos 38 do segundo tempo. Ele abraçava, gritava, deixava de lado as carências da vida, o olhar triste, o sorriso tímido...
Luís também estava comigo no primeiro título nacional do Mengão. Chorávamos juntos na arquibancada. Pai e filho, irmão mais velho e irmão mais novo, parceiro e parceiro...
A vida traçou seus caminhos. Fui morar longe do Rio. Perdi o contato.
Não vi mais o menino e os seus sonhos de criança.
Não soube mais nada do jovem e de seus planos para o futuro.
Não tive nenhuma notícia do homem, das suas realizações, das suas descobertas e dos seus tombos...

Hoje recebi um e-mail da mãe. O menino que dividiu tantas emoções comigo no Maracanã, me fez sentir pai por alguns instantes, irmão mais velho por outros, perdeu o jogo mais difícil da vida dele. Não era hora ainda mas Luís preferiu se despedir...
A arquibancada ficou mais triste para mim.
Espero que num outro estádio, ele seja mais feliz.

Ricardo

5 comentários:

Bia Prado disse...

Lindo e triste, Ricardo.
Que bom que ele teve vc!
Beijo

Regina disse...

Meu amor,

A sensibilidade dos seus textos consegue que eu sinta a sua dor mesmo não conhecendo os personagens. Como disse a Bia, que legal ele ter curtido com você bons momentos no Maraca!
Na sua memória ele ficará sempre vivo e feliz comemorando gols do seu mengão.
Te amo.

Sá disse...

"Zé la vi", infelizmente...
Abraços,
Outros torcedores estão nascendo...

Monica disse...

Sou Monica, a irmã mais velha do Luis Felipe. Já naquela época me emocionava saber que meu irmão tinha um amigo-pai e me sentia feliz por ele estar feliz contigo. Agora com lágrimas nos olhos sinto a emoção do passado, a saudade do presente e a alegria do carinho que você e todos sempre sentimos por ele. Obrigado por essa homenagem tão bonita. um forte abraço, Monica Goes

Reynaldo disse...

Ricardo,
Realmente os seua textos são maravilhosos.
Quanta emoção eu senti lendo esse texto mesmo não tendo conhecido o Luis Felipe, estou aqui chorando na mesa do escritório. Que bom que o Luis Felipe teve um amigo, parceiro, pai, amigo como você no momento das descobertas.
Super abraço.